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Universidade Federal do Ceará
Museu de Arte da UFC – Mauc

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Exposição 1969.03 – Zenon Barreto – 05/09/1969

(Transcrito do Catálogo)

Um Artista Chamado Zenon

Zenon Barreto faz de sua carreira artística um exemplo de honestidade e capacidade no qual os jovens deveriam meditar.

Vindo nas bases da “média guarda”, Zenon sentiu o influxo dos pioneiros “escapianos “na renovação de nossa arte começada em 42 e contatou com gerações seguintes sempre procurando elevar o nível artístico do nosso meio e transmitir aos demais os seus conhecimentos e suas experiências.

Com muita seriedade, e indo até a agressividade verbal, Zenon influía nos acontecimentos da arte cearense onde sua participação encerrava realizações das melhores.

O caminho artístico de Zenon mostra, no tempo mais remoto, trabalhos de caráter expressionista com colorido rico, variado, de impacto visual, com temas humanos cujas figuras, em fase posterior, passou a deformar seguindo a linha de Picasso, Portinari, Di Cavalcanti etc., buscando maior força dramática.

Já depois de 1950 o artista procurou um domínio mais completo do artesanal e tratou seus temas dentro de uma composição estilizada, usando cores mais puras e de chapada, construindo o espaço com rigor estético-formal.
Os desenhos acompanhavam o mesmo ritmo de evolução da pintura, eliminando-se detalhes, simplificando-se e enriquecendo o sentido formal de onde, juntamente com a composição, lhe vinha o novo caráter de sua expressividade.

Zenon desenvolve-se na representação de formas estilizadas, o fazendo com muito acerto e propriedade, compondo criações cujas linhas de construção formavam um todo encerrando uma sucessão de ritmos que o sentido visual-estético do observador retinha.

Ao mesmo tempo o artista ataca o material escultórico com o mesmo ardor, o mesmo critério, o mesmo sucesso, e vai transformando metal, madeira, massa em peças de arte.

Zenon segue seguro sua penetração artística em profundidade e extensão. Pintando, desenhando, esculpindo, gravando, percorrendo várias soluções estéticas e diversos materiais. Faz painéis inclusive com utilização de pastilhas entre os quais se destaca o do D.A.E.R.

Seus elementos temáticos se realizando ainda em ritmo estilizado de serenidade buscavam uma beleza estática numa criação artística inspirada nos motivos comuns da vida.

Em entrevista, concedida ao jornalista Mário Pontes, dizia Zenon : “- O que eu pinto? Pinto a vida, tomada a palavra no seu sentido mais amplo. Com frequência porém inspiro-me (embora considere a palavra perigosa) na paisagem e nos tipos humanos do nordeste; capto o que tem de plástico e desprezo inteiramente o anedótico.”

A revista Habitat dizia sobre ele: “- Em Zenon Barreto, o que chama a atenção é a absoluta discrição das linhas, sua autêntica firmeza de traço, o conhecimento básico do desenho, a simplicidade e precisão no arranjo estrutural. Uma técnica que consegue escapar ao próprio humano para reduzir-se às sintéticas esquematizações estéticas.”

Zenon, que sempre tem uma porta aberta para o novo mas que antes de aceitá-lo procura-lhe a validade, não ficaria indiferente ante as escolas surgidas. Pesquisa-as à medida que elas surgem em seu caminho.

Quando Bandeira veio novamente ao Ceará para uma exposição no Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará trouxe, em sua arte, a representação de um informalismo que consubstanciava uma inteira liberdade na captação e interpretação artística substituindo a verdade superficial do tema-motivo por outra mais profunda necessitada da sensibilidade artística para ser revelada. Bandeira, o artista e a pessoa humana, deixou nos colegas do Ceará, sem que percebessem, essa nova atitude interpretiva e representativa da percepção artística.

Zenon Barreto, que é um temperamental, tanto para o afeto como para a agressividade, penetrou no informal, dando folga a sua disciplina e domínio preconcebido da forma e composição presos inteiramente a sua vontade, e criou uma série de trabalhos livres, intuitivamente concebidos e dirigidos, sem buscar equivalentes na objetividade do real percebido através dos cinco sentidos.

Em outra entrevista concedida a Humberto de Araújo, Zenon dizia das principais tendências contemporâneas dos nossos pintores: – “Tendência subjetiva, isto é, a pintura abstrata. Naturalmente que não somos compreendidos como os leigos desejam à maneira do século passado, isto é, objetivamente. O problema das artes plásticas hoje é comover. É a razão de ser da pintura, máquina de comover. Forças atuam sobre as nossas sensibilidades e se atuam existem desde que as sentimos. E como explicar ou dissecar um acontecimento emotivo? Exegese ilusória! As palavras não têm as sutilezas das sensações. Estas são positivamente um mistério.”

Em 64 Zenon expõe na Galeria SER um conjunto de pintura, desenho e escultura, sendo os dois primeiros gêneros em execução abstrata. A escultura se mantinha figurativo-estilizada.

Seguindo a linha abstrata, os temas assumem sua personalidade de obra de arte independente, sem identificação com modelos, onde o objeto desaparece, após o trabalho criador do artista que mergulhara fundo e voltara à superfície com seu produto estético.

Zenon vai prosseguindo nos seus diálogos com a arte cultivando a linguagem da época e da vida, procurando retirar, desse conjunto, tudo aquilo que lhe sirva.

Em 1967 Zenon sente ressurgir, em si, os temas que envolvem os costumes e figuras folclóricas do Nordeste. É a vida comum que o chama de volta para, ao contato solidário de um organismo social rico de nada e carente de tudo, refletir, como já fizera, uma arte mergulhada nessas raízes humanas que sofrem o peso de contradições superiores.

Surge, nesse momento, o seu álbum de xilogravura “Figuras do Nordeste” contendo trabalhos com base nos motivos populares.

Neste ano de 1969, nesta mostra, Zenon apresenta uma série de trabalhos, recentemente executados, onde volta aos temas populares mas o fazendo de um modo diferente, sob um ângulo novo.

O artista toma como modelo um trabalho da arte popular, uma escultura de Vitalino, um ex-voto, gado, vaqueiro, objeto, Amazonas, e até brinquedo infantil. O “Lenhador”, de Vitalino, é pintado num interior de floresta e assim vai Zenon dando, a cada um dos modelos, o seu ambiente natural ao qual está identificado como “os milagres”(ex-votos) colocados numa paisagem onde se divisa a igreja de Canindé, que é o maior ponto de concentração dessa arte popular calcada na fé religiosa.

Pessoas menos avisadas podem pensar que Zenon esteja fazendo primitivismo, o que não é verdade. Acontece que o artista tomou seus elementos centrais da arte popular e esta é feita com simplicidade e certa dose de ingenuidade. Procurando ambientar os elemntos-tema, tinha o autor que ser coerente e dar o mesmo toque de singeleza própria do modelo para bem harmonizar o conjunto e melhor integrar as partes que se reencontrava na criação artística do pintor.

Os trabalhos que Zenon hoje nos apresenta não o fez o autor, como nunca faz, para agradar ou provocar um deslumbramento ótico fácil. Muito ao contrário, há que se admirá-los serenamente na harmonia do ritmo de suas linhas de construção e necessitando, até mesmo, um certo refinamento para percepção de alguns detalhes e o alcance estético do que é visto.

Zenon se despoja do colorido enganoso, e, num ascetismo de monge, o reduz em quantidade e variedade, e mais ainda, elege os tons diversos de cores frias predominando sobre as quentes que usa no mínimo necessário, dando aos trabalhos um clima e um sentimento penetrante de tristeza, uma bela tristeza.

O equilíbrio da composição, bidimensional, a pureza das cores e o bom tratamento da tinta em fatura de chapada, a estilização formal, a segurança da execução e a concepção criadora impõem ao produto artístico uma valorização que atinge aos propósitos estéticos.

Não se pense também que a presente mostra represente uma nova fase de Zenon. O que temos é uma série de trabalhos, aliás com características de execução de colorido já por ele aplicado em tempos passados, que recebeu do autor mais uma contribuição de sua atividade mental a serviço da criação e composição do seu produto artístico bem elaborado que no caso presente, resultou em unu, pela arte, dois fatores pertencentes ao mesmo meio que estavam, também pela arte, isolados, separados arbitrariamente.

Zenon fez a volta às origens, ao ventre materno, ao meio querido necessário e perdido nos desencontros da vida, pelo que “a família penhorada lhe agradece”. Isto é, os modelos que ele tomou fazendo-os retornar aos seus pagos.

Ao lado dos trabalhos de pintura Zenon expõe, como sempre acontece, esculturas anteriores e abrangendo soluções e material diferentes que não obstante sua diversidade no tempo comum aos gêneros praticados encontram sua unidade no cômputo geral.

A arte de Zenon é sempre de boa qualidade em qualquer gênero que seja. Disso os maiores já se deram conta, daí por que os títulos que acumula em sua biografia.

O M.A.U.F.C. anda acertado nas boas mostras que faz e sendo Zenon Barreto um dos nossos mais completos artistas, e pertinazmente arraigado ao Ceará, aumenta, com mais esta , o número de boas exposições que nos tem dado a melhor e maior instituição dedicada a arte no Ceará.

Estrigas


Catálogo

Pintura

1 Amazona em Cerâmica Popular na Paisagem Azul – 1969 – óleo s/tela – 0,60 x 0,44
2 Cerâmicas Carajás na Floresta – 1969 – óleo s/tela – 0,50 x 0,65
3 Papagaios, Céu e Sol – 1969 – óleo s/tela – 0,61 x 0,46
4 Natureza Agonizante em Vaso Chileno – 1969 – óleo s/tela – 0,62 x 0,50
5 Lenhador de Vitalino na Mata – 1969 – óleo s/tela – 0,65 x 0,52
6 Cerâmicas da Bahia numa Fazenda – 1969 – óleo s/tela – 0,55 x 0,67
7 Ex-Votos de Canindé em Desfile – 1969 – óleo s/tela – 0,65 x 0,50
8 Papagaio de Jornal – Homenagem ao meu Amigo Paulo Cabral de Araújo – 1969 – óleo e colagem s/tela – 0,65 x 0,50
9 Boneca de Pano e Quartinha c/ Papoulas – 1969 – óleo e colagem s/tela – 0,65 x 0,50
10 Xilografia Popular Em Campo Florido – 1969 – óleo s/tela – 0,66 x 0,48
Em algumas dessas obras, o autor usou como temática peças de sua coleção de arte popular como também indígena.

Escultura

1 Uma Face – 1956 – madeira – alt. 0,74
2 Crucifixo – 1961 – ferro, cobre e latão – alt. 3,20 – Acervo do Mauc
3 Torre – 1964 – aparas de bronze – alt. 1,10
4 Conjunto Trapezoidal – 1969 -ferro e Llatão – alt. 1,00
5 Moça com Pote – 1969 – madeira – alt. 0,72
6 A Chama – 1969 – madeira – alt. 0,69 – 1° Prêmio Xix – Salão Municipal de Abril (SMA)
7 Enleio – 1969 – madeira – alt. 0,45
8 Iracema Chorando – 1969 – madeira – alt. 0,53
9 Galo – 1969 – madeira Pirogravada e Cobre – alt. 0,60
10 Beato – 1969 – madeira carbonizada – alt. 1,06

Objeto

1 A Lágrima – 1968 – Metais e Vidro – 0,81 x 0,61

Ao Técnico Sr. Otto Ricardo Saunders, Proprietário da oficina Laboratório “Italdiesel Ltda”. _ Av. Herácrito Graça, 37/49 _ encarregada da preparação do ” Módulo Em 5″, que por motivo de força maior não pode ser exposto, e ao Técnico Sr. Walmir Maia, que também prestou a sua valiosa colaboração à presente mostra, os meus sinceros agradecimentos.

Zenon

ZENON


Catálogo da Exposição Zenon 1969

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